Lei das fake news: como isso afeta sua empresa?

Lei das fake news

A lei das fake news pode ser considerada desde já um avanço, mesmo que ainda tenha pontos a serem aprimorados.

Afinal, as notícias falsas são um problema que custa anualmente US$ 78 bilhões em prejuízos para a iniciativa privada e órgãos públicos, segundo uma pesquisa da Universidade de Baltimore (em inglês).

Outro ponto muito importante destacado no estudo, feito em parceria com a plataforma Cheq, é o impacto das fake news sobre o mercado financeiro.

Por causa desse tipo de conteúdo, empresas de diversos segmentos vêm registrando perdas expressivas ao longo da última década.

Não são apenas as grandes empresas de capital aberto que sofrem com as fake news.

A falta de controle pode gerar prejuízos incalculáveis para todo o mercado e para a sociedade civil organizada.

Neste texto, ajudo a entender o que está em jogo e o que pode melhorar para que a internet seja um ambiente ainda mais seguro e confiável.

O que é o Projeto de Lei 2630/20?

De autoria do parlamentar Alessandro Vieira, o PL 2630/20, mais conhecido como Lei das Fake News, é uma proposta de lei para coibir a veiculação de notícias falsas.

Ela avança ainda sobre outros aspectos que, embora não estejam relacionados à ética jornalística, afetam a credibilidade dos portais de notícias, como a questão da publicidade.

A propósito, o título oficial do projeto deixa clara essa intenção abrangente: “Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet”.

Por que o nome “lei das fake news”?

Um dos maiores desafios para as autoridades públicas é determinar de quem é a responsabilidade pelos efeitos provocados por uma notícia falsa.

É disso que o PL 2630/20 trata.

Ele estabelece mecanismos de controle mais rígidos sobre as empresas que divulgam informações online, com foco nos motores de busca e nas redes sociais.

Também foca em outro problema que vem tomando grandes proporções nos últimos anos: a propagação de notícias falsas como recurso eleitoral.

Com a lei das fake news, pretende-se estabelecer um controle mais rígido sobre a mídia programática, restringindo o compartilhamento de dados dos usuários, entre outras medidas.

Principais pontos da lei das fake news

Estamos falando de um projeto de lei, cuja tramitação é bicameral.

Ou seja, ele passa primeiro pela aprovação do Senado, que o envia à Câmara dos Deputados para revisão e, se aprovado na íntegra, o texto segue para a sanção presidencial.

Atualmente, ele se encontra em revisão, ou seja, aguardando modificações em pontos considerados passíveis de melhoria pela Câmara dos Deputados.

Como veremos a seguir, até que ele seja enfim encaminhado para o presidente da República, uma série de artigos e proposições deverão ser alteradas.

Confira quais são os mais polêmicos e os que já são considerados um avanço.

Proibição de disparo em massas

Se aprovada pelo presidente, a lei das fake news vai proibir o disparo de mensagens em massa para fins eleitorais.

Essa proibição se estende a eventuais programas e softwares que venham a ser desenvolvidos com essa finalidade.

A exceção para os órgãos públicos seria o envio de campanhas institucionais e de caráter emergencial, como os alertas emitidos pela Defesa Civil.

Registros para investigações

Também é considerada positiva a proposta que obriga em um dos seus artigos que empresas que forneçam motores de busca e redes sociais tenham representação no Brasil.

O caso do Telegram, por exemplo, expôs essa necessidade.

Depois que o aplicativo foi proibido de ser disponibilizado para download por se recusar a atender solicitações da Justiça, seus representantes tiveram que vir dos Emirados Árabes para prestar esclarecimentos às autoridades.

O entendimento é que, com um escritório representando a empresa no Brasil, a aplicação da Justiça será muito mais ágil.

Punição a plataformas

E por que o Telegram foi cancelado no Brasil?

A questão girou em torno de uma solicitação da Justiça para que a plataforma ajudasse a coibir a propagação de mensagens extremistas e, principalmente, notícias falsas.

O caso mostrou que, na prática, o Telegram e seus gestores estiveram sempre imunes a qualquer tipo de punição.

Por não serem legalmente representados no país, não precisavam se submeter à lei brasileira.

A lei das fake news deve mudar esse panorama e obrigar que empresas como o Telegram sejam legalmente imputáveis, ou seja, passíveis de sanções como multas e até prisões.

Relatórios de transparência

De acordo com a nova lei, motores de busca, redes sociais e apps de conversação serão também obrigados a enviar relatórios periódicos de transparência.

As empresas deverão prestar informações sobre o uso que fazem dos dados coletados, usuários ativos e conteúdos removidos, entre outras.

Esse é um ponto considerado dúbio, já que, se por um lado é bom para a sociedade, por outro, pode prejudicar as empresas que operam online.

Segundo o Google, esses relatórios podem inclusive servir como um “guia” para crackers burlarem os algoritmos e conseguirem melhores posições na SERP.

Remuneração ao jornalismo

Lei das fake news
Lei das fake news

Um dos pontos mais controversos da nova lei é a obrigatoriedade de as empresas digitais pagarem aos órgãos de imprensa com mais de um ano em atividade para veicular notícias.

A polêmica principal, nesse caso, é que a lei não especifica em que casos essa remuneração se aplicaria, tampouco a forma como seriam feitos os pagamentos.

Além disso, é consenso entre especialistas e até entidades de classe de jornalistas que, como está, a lei inclusive fere a liberdade de imprensa.

Isso porque ela favorece a formação de oligopólios, ao abrir caminho para que somente os grandes veículos controlem o acesso à informação.

Imunidade parlamentar nas redes

O texto da lei também não se aprofunda em uma outra proposta, a de estender a imunidade parlamentar às mídias digitais dos políticos.

Com isso, seria muito mais difícil remover conteúdo considerado ofensivo ou que ajude a disseminar a desinformação.

De teor ambíguo, essa parte da lei não esclarece, por exemplo, se um parlamentar poderia manter no ar uma notícia falsa ou que viole claramente as políticas públicas de transparência.

Identificação de conteúdos

Outro ponto dúbio é o que prevê que os sites online identifiquem o que é publicidade, inclusive a propaganda eleitoral.

A diferença é que, com a lei das fake news, essa identificação será feita com ainda mais detalhamento.

As empresas deverão informar, nesse caso, o orçamento da campanha e quais critérios foram usados para selecionar o perfil dos eleitores impactados pelas peças.

Embora interessante do ponto de vista da transparência, para as pequenas empresas digitais, isso pode ser prejudicial.

Não tanto pela obrigatoriedade de informar seus gastos, mas sobretudo em razão das restrições de compartilhamento que essa obrigação provoca.

Como a lei das fake news pode reduzir o acesso a informações

O Google se posicionou publicamente a respeito da lei das fake news, em um artigo assinado pelo presidente do Google Brasil, Fábio Coelho.

De acordo com a empresa:

“O PL 2630 pode tornar nossas plataformas menos seguras ao obrigar a divulgação de informações estratégicas que poderiam ser usadas por pessoas mal-intencionadas”.

Segundo o Google, a insegurança é decorrente da necessidade de divulgar informações altamente detalhadas sobre o funcionamento dos motores de busca.

Entre essas informações, estariam “detalhes sobre a base de treinamentos de sistemas e métodos usados para melhorar os serviços, monitorar violações e adotar medidas de fiscalização”.

Como a divulgação de informações torna os sites menos seguros

Não restam dúvidas de que a transparência é o único caminho possível para preservar a ética jornalística e publicitária na internet.

Por outro lado, obrigar os players digitais a revelar como eles operam tão minuciosamente pode acabar sendo um tiro pela culatra, favorecendo a ação de criminosos virtuais.

O ideal é que haja um equilíbrio de forças, de modo que a transparência não seja radicalizada a ponto de se tornar um problema, prejudicando assim o próprio mercado.

O PL 2630 pode prejudicar a divulgação de produtos?

Nos atuais termos, percebe-se que a lei das fake news tem um viés muito mais político do que comercial.

Ela pode ser muito eficaz para coibir partidos e candidatos a cargos públicos de disseminar calúnias, mas pelo ponto de vista do marketing digital, ainda se mostra inconsistente.

Questionamento do Google sobre a PL das fake news

O artigo-manifesto do Google levanta ainda outras questões importantes sobre o acesso à informação, como é o caso da possível remuneração aos órgãos de imprensa.

Com poucos veículos controlando a mídia online, a concentração em torno dos grandes conglomerados midiáticos tende a aumentar, minando os esforços dos sites pequenos.

Impacto do comunicado Google

Como era de se esperar, o comunicado do Google repercutiu amplamente nos principais portais de notícias brasileiros.

Entre os mais renomados, destacam-se o portal G1, que destacou na manchete a postura crítica do Google, a revista Exame e o site Tecmundo, que menciona a preocupação da big tech com o projeto.

Como a PL poderia ser melhorada

Lei das fake news

Acredito que um tema tão sensível como a propagação de notícias falsas precisa ser tratado com o máximo de cuidado.

Primeiramente, para evitar que seja publicada uma lei inócua, sem efeitos práticos e, ainda pior, que possa até ajudar a disseminar práticas obscuras.

Uma revisão exaustiva também se faz necessária para que os pontos duvidosos sejam esclarecidos, e a lei seja o mais assertiva possível.

Com base no que propõem os especialistas e no consenso entre a maior parte deles, veja a seguir em que pontos a lei das fake news poderia ser mais efetiva contra a desinformação.

Flexibilidade de regras para empresas

Uma das críticas que estão sendo feitas ao atual projeto são as regras demasiadamente rígidas sobre a publicidade online.

Nesse aspecto, os parlamentares precisam desenvolver mecanismos que sejam rigorosos, mas não a ponto de tolher a liberdade de ação necessária numa economia de mercado.

Clareza nas regulamentações

A ambiguidade de certos artigos é um ponto preocupante, em especial no que impõe a remuneração aos órgãos midiáticos.

Embora a mídia brasileira precise ser valorizada, o caminho para isso certamente não é fazer das empresas digitais suas clientes cativas.

Órgão responsável pelas penalidades

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) existe para fiscalizar a aplicação da LGPD e impor sanções nos termos da lei de dados.

A lei das fake news, por sua vez, não estabelece claramente se a ANPD abraçaria a missão de fiscalizar também o seu cumprimento, tampouco prevê a criação de um órgão só para isso.

Definição do que é imunidade

A extensão da imunidade parlamentar aos canais digitais dos partidos e políticos é controversa.

Ela não especifica, por exemplo, que tipo de imunidade seria essa, ou a que processos legais os sites que possam infringir a lei estariam imunes. 

Tirar a necessidade de remunerar órgãos de imprensa 

Para boa parte dos especialistas, o artigo que prevê a remuneração dos veículos jornalísticos não é benéfico de forma alguma.

Esse é um ponto da lei que poderia ser inclusive suprimido, contando para isso com o apoio até mesmo das entidades de classe da imprensa brasileira.

Existe pressa pela aprovação?

Como noticiou a CNN Brasil, uma ala dos parlamentares favoráveis à lei das fake news teve um requerimento de urgência rejeitado pela Câmara dos Deputados.

Isso revela que existe uma certa pressão por parte principalmente da oposição, que claramente apoia a lei das fake news para limitar a capacidade de divulgação do atual governo nas próximas eleições.

O que esperar depois da aprovação

Questões políticas à parte, se as alterações que se esperam forem feitas, a lei das fake news tem tudo para ser um avanço.

Além de coibir a veiculação de notícias falsas, ela deve aumentar a transparência, servindo como um importante complemento à LGPD.

De qualquer forma, tudo leva a crer que deve levar tempo até que ela seja submetida à sanção presidencial, tendo em vista as lacunas que precisam ser preenchidas.

Conclusão

Acredito que a lei das fake news vem para somar.

Se efetivamente melhorada e aprovada, ela deve tornar o ambiente digital de negócios ainda mais seguro no Brasil, que já tem inclusive uma legislação avançada sobre o uso de dados.

Você é a favor ou contra o PL 2630?

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